A felicidade possível

Por - em 8 anos atrás 844

A felicidade possível

O poeta e escritor português Fernando Pessoa, considerado um dos ícones da língua portuguesa e da literatura universal, ao falar sobre o valor da vida, assim se expressou: “às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido”.

Penso que a felicidade se expressa nestes instantes em que um pequeno detalhe ou os fatos aparentemente insignificantes da vida tocam à alma.

O ser humano vive uma busca incessante e frenética pela felicidade. Muitos a projetam nas grandes conquistas nos campos profissional, afetivo e social, por exemplo.

Ao colocar a felicidade plena como foco da trilha existencial, deixamos de perceber que a vida é marcada por momentos felizes, que uma vez vividos com a devida intensidade, representam a felicidade possível no instante presente.

Alguns vivem na ansiedade por conquistar a felicidade num tempo futuro, sem dar o devido valor aos instantes felizes, que se multiplicam no tempo presente.

Neste sentido, é importante relembrar a frase de Gandhi, que diz: “Não existe um caminho para a felicidade. A felicidade é o caminho”.

Assim, não adianta esperar encontrar um pote de ouro onde nasce o arco-íris.

As moedas vão surgindo ao longo da caminhada formando, em seu conjunto, o tesouro que tanto almejamos.

Muitas vezes ouvimos a seguinte frase:

“Estou sorrindo tanto hoje que, com certeza, vai acontecer alguma coisa ruim no amanhã”.

Ou, ainda:

“Hoje estou tão bem que desconfio que algo ruim irá acontecer em minha vida”.

Na minha leitura, estas duas frases representam uma espécie de chantagem subjetiva e inconsciente.

Explico:

De alguma forma, o nosso inconsciente, talvez alicerçado num instinto de defesa, nos cobra uma atitude de alerta constante, em face dos momentos felizes vividos e das supostas relações destes com as tribulações futuras da vida.

A chantagem é exatamente esta, ou seja, a cobrança inconsciente de uma atitude preventiva quanto aos momentos de tristeza, de aflição, de dor e de perdas, entre outros.

Assim, parece que o nosso inconsciente sempre deseja nos deixar numa situação de alerta, como se ao homem não fosse dado o direito de, por meio de suas atitudes e de seus comportamentos, saber retirar, inclusive destes momentos de tribulações, saldos positivos que contribuam para o seu amadurecimento e o seu crescimento individual.

É por conta desta espécie de chantagem subjetiva e inconsciente que desconfiamos dos momentos felizes da nossa vida, inclusive achando que eles prenunciam instantes de tristeza, de descontentamento ou de dor, no tempo futuro.

Neste sentido, penso que cada instante de felicidade vivido representa um fragmento insubstituível da felicidade plena que almejamos. Ou melhor, talvez este fragmento seja a felicidade plena que o momento existencial nos proporciona e que deve ser intensamente vivido.

Com base neste pensamento, creio que a felicidade plena que esperamos conquistar numa vida inteira, pode ser vivida nos momentos especiais que a caminhada existencial proporciona.

Nesta perspectiva, concordo com a assertiva já citada de Mahatma Gandhi de que felicidade plena não está no fim da caminhada e sim no próprio caminhar.

Finalmente, recorro a uma frase do escritor e dramaturgo alemão Johann Goethe que corrobora com a presente reflexão, qual seja: “Na plenitude da felicidade, cada dia é uma vida inteira”.

 Assim, se a plenitude da felicidade transforma cada dia vivido numa vida inteira, que cada um possa viver com intensidade os instantes felizes que a existência nos proporciona, sem nenhum temor de que eles sejam prenúncios de tribulações futuras.

Se, portanto, o futuro é incerto e imprevisível, por que reservar ao amanhã a conquista de uma suposta felicidade plena, se Deus, na expressão de Sua Bondade infinita, já nos concede em abundância a felicidade possível nos diversos instantes vividos no cotidiano?

Sejamos felizes, pois!

Flavio Romero Guimarães