Ano Novo

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A escritora Rachel de Queiroz escreveu uma crônica na qual ela falava de um misto de saudade e esperança que são tomadas as pessoas quando se inicia um ano novo. Ela disse: “A alma é obstinada, não desiste dos seus desejos, e não há desengano que os mate. Aliás, a função dos desenganos não é propriamente matar esperanças, mas desviá-las para outros caminhos. E até na hora da morte o homem ainda espera e deseja – a eternidade, a glória, a paz, ou, quando o coração é por demais humilde e descrente e não supõe que a glória tenha sido feita para si – deseja pelo menos o bem supremo do sono e do esquecimento.

Sim, a esperança é a última que morre. E, por isso mesmo, a cada ano que nasce, a gente a bem dizer se renova, muda a pena como passarinho ou muda o couro da alma como cobra. Tal como cobra, ficam por baixo as manchas, mas a pele é nova e dentro dela a criatura se sente renovada também. E, afinal, o lógico é em verdade esse renovamento. O ilógico é o desgaste, a velhice”.

Digo que há nesse escrito verdade e sensibilidade. Verdade por ser fato observado e sensibilidade por ser descrito com poesia. O ser humano, a cada virada de ano, faz como que uma análise introspectiva de sua vida e no íntimo ao reconhecer seus erros e seu egoísmo promete a si mesmo mudar, dar uma nova dimensão à sua existência. Quer perdoar seus desafetos, esquecer as ofensas sofridas, pensar mais fraternalmente, doar-se de corpo e alma às ações nobres. É como que um banho de amor que lhe lava o coração, para desapegado das coisas materiais retomar sua caminhada.

Apesar da boa vontade para o propósito que elege, na sua consciência ou mesmo no seu inconsciente, a água que lhe retira as sujeiras não é capaz de torná-lo limpo e puro, à falta de detergentes adequados necessários à limpeza eficaz. Algumas manchas desaparecem, outras esmaecem, outras ainda permanecem. Mesmo assim, sente-se renovado, por dentro e por fora, feliz e bem disposto, desejoso da realização da mudança que se auto impõe.

Todavia, bom seria que não mudasse somente as penas ou a pele como fazem os passarinhos e as cobras, pois neles continuam os instintos. Melhor ainda seria que mudasse todo o seu corpo rastejante de lagarta em de esvoaçante borboleta multicor, para que desta forma nada mais lhe restasse, nem manchas, nem pensamentos, nem lembranças. Seria assim um verdadeiro nascer de novo, como que um homem jovem que emerge de um homem velho sem os liames da natureza inferior, como que uma criança que chega plena de inocência.

Embora não seja assim, o ano novo sempre traz esperança, vida nova. Esqueçamos, pois, nossas tristes lembranças, nossas cicatrizes. Sejamos fiéis aos nossos novos propósitos e, de certo, seremos mais fraternos e mais felizes. Aos Caros Leitores, Feliz Ano Novo.

(*) Professor Ailton Elisiário